O economista Paulo Gala, professor da economia da EESP/FGV, é um dos maiores especialistas em política industrial e comércio exterior do Brasil. Muito ativo nas redes sociais, vem chamando a atenção do grande público para a importância dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), em particular, para o Brasil. Estabelecido em 2006, o grupo pesa cada vez mais nas relações internacionais, com destaque para a China e a Índia.
Segunda maior economia do mundo, depois dos Estados Unidos, segundo Gala a China se estabeleceu como um líder global em inovação e tecnologia, com empresas como a Huawei, Tencent e Alibaba, que atuam em setores como telecomunicações, comércio eletrônico e inteligência artificial. E passou por um grande avanço na infraestrutura, com a construção de sua rede de ferrovias de alta velocidade e projetos ambiciosos de logística, como a iniciativa do Cinturão Econômico da Rota da Seda.
A Índia também emergiu como líder global em serviços de tecnologia da informação e terceirização de processos de negócios. Cidades como Bangalore são centros tecnológicos, com empresas de TI de renome.
O país é um dos maiores produtores de medicamentos genéricos do mundo. Destaca-se, também, na pesquisa espacial, com realizações notáveis, incluindo a Missão Marte Orbiter (Mangalyaan) e o lançamento de inúmeros satélites para diversos fins.
Em postagem recente no X (antigo Twitter), Gala elencou diversas razões para que o G-7 (Canadá, Estados Unidos, Reino Unido, França, Itália, Alemanha e Japão), o grupo de países mais desenvolvidos e industrializados do mundo, passe a levar mais a sério a existência dos BRICS, que somarão, em breve, 3,7 trilhões de habitantes — ou seja, 46% da população mundial. Vamos a elas.
China, Índia e Brasil estão entre as 10 maiores economias do mundo. Os indianos também pousaram na Lua, e os BRICS (Rússia, oito; China, três; e Índia, um) estão quase igualando o número de missões lunares dos EUA (15).
Os BRICS representam 32,1% do PIB global contra os 29,9% do G-7. Em 2024, cinco países se associaram: Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita, Etiópia, Egito e Irã.
Em 2023, a Índia tornou-se a maior população do mundo, com o maior número de usuários do Facebook, Instagram, You- Tube e WhatsApp, e exportou mais em software (US$ 133 bilhões) do que a Arábia Saudita em petróleo (US$113 bilhões). Em 2022, a China comprou 97% de todo o lítio da Australia, o maior produtor mundial, e responde por 57% dos carros elétricos do planeta.
A maioria das pessoas no Ocidente não conhece a Saudi Aramco, a petroleira da Arábia Saudita, que, agora, faz parte dos BRICS e fatura U$ 48 bilhões/ano, mais do que a Tesla, Meta, Apple e Microsoft juntas, que somam US$ 45 bilhões/ano. As duras sanções do Ocidente contra a Rússia são quase inúteis, porque os russos estão inundando a Ásia com petróleo — e os chineses inundando a Rússia com produtos industrializados.
Os chineses lideram a distribuição de supercomputadores. A indiana Tata Motors comprou a Jaguar e a Land Rover. A chinesa Geely comprou a Volvo, e a vietnamita Vinfast abriu capital na Bolsa de Nova York e já vale mais do que a General Motors.
O leste da Ásia (China, Índia, Coréia do Sul, Taiwan e Japão) formam o bloco econômico mais importante do mundo, maior do que os EUA ou a Zona do Euro, pois 70% do crescimento do mundo este ano vem da Ásia — a China, sozinha, responde por 1/3 do crescimento mundial.
Mais de 20 países querem entrar nos BRICS. Bangladesh, por influência da Índia; Egito, Etiópia e Marrocos, da Rússia; Belarus e Cazaquistão, antigas repúblicas soviéticas, também fizeram a solicitação.
Tailândia e Vietnã pediram para ingressar no bloco, e Argélia busca aproximação. Países ligados aos Emirados Árabes Unidos — como a Palestina, Nigéria e Bahreim — já manifestaram interesse. O Irã não fica atrás.
Na América Latina, países como Cuba, Honduras e Venezuela querem ingressar no bloco. O próximo encontro do BRICS será em Moscou e caminha nessa direção.
É uma grande mudança geopolítica. Entretanto, há contradições políticas relevantes entre esses países. Exemplo: a Rússia é aliada da China, porém, a Índia é aliada dos Estados Unidos. É um erro avaliar que esses países formam um bloco monolítico, tanto quanto é insensato, no caso do Brasil, um alinhamento que não leve em consideração as relações históricas com os EUA e a União Europeia.
Nosso principal parceiro comercial é a China, que compra nossas commodities minerais e de alimentos, e nos vende a maior parte dos produtos industrializados que consumimos. Isso está matando a nossa indústria e nos toma mercado. Essa mudança geopolítica está por trás da crise da Venezuela, que rompeu com o Ocidente democrático e se tornou aliada incondicional da China.
Essa não pode ser a nossa. Defendemos a democracia e uma política externa independente e pragmática, cujo eixo são nossos interesses. Devemos nos relacionar igualmente com os países dos BRICS e o Ocidente democrático, ao qual pertencemos.
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